sexta-feira, 19 de abril de 2024

As crianças e o método BLW, por Eduardo Marcondes

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Eduardo Marcondes (*)

 

A Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) lançou recentemente um guia sobre alimentação complementar, que traz alguns estudos e orientações particulares sobre o método BLW(Baby-led Weaning), no qual o bebê deve levar sozinho os alimentos à boca. Entre as orientações básicas do BLW estão: oferecer os alimentos preferencialmente in natura em vez de preparar papinhas, oferecer alimentos variados, sempre colocar a criança sentada e interagir com ela na hora das refeições. A preocupação com esse tema é antiga por parte daqueles que, como eu, abraçaram a profissão que tem como pacientes as crianças. Por isso, é muito bem vinda a iniciativa da SBP.

 

Mais da metade das mães brasileiras acredita que o filho não come bem. Essa dificuldade da criança para se alimentar pode estar relacionada a alguma condição médica ou a problemas comportamentais. Em ambos os casos, há riscos de déficit nutricional que, em casos severos, podem prejudicar o desenvolvimento na infância. Quando o problema é comportamental, no entanto, os riscos podem ser ainda mais amplos. Pesquisas internacionais demonstram que crianças que são forçadas a comer, que são extremamente seletivas ou que desenvolvem um sentimento de medo em relação à alimentação, têm mais chances de apresentar problemas psicológicos, como depressão e delinqüência, quando chegam à adolescência.

 

A situação é agravada por um problema estrutural na medicina: nenhum pediatra sai da faculdade com o treinamento necessário para reconhecer essas dificuldades, muito menos para orientar os pais. O pediatra não recebeu, dentro da faculdade e da residência, um treinamento adequado para diagnosticar e tratar esse tipo de problema. Por isso é importante saber o que fazer com filhos que relutam em comer. As dificuldades alimentares da infância costumam ter início na fase em que a criança tem contato com alimentos pastosos – por volta dos seis meses, quando as papinhas são introduzidas na dieta.

 

Entre dois e três anos, a criança enfrenta também uma oscilação natural de apetite. A reação dos pais a esse comportamento de rejeição ao alimento pode ser fundamental na maneira como ela passará a enxergar o ato de se alimentar. Não adianta colocar uma pressão enorme nas costas da mãe dizendo que a criança precisa comer mais. Isso pode ter resultados piores do que uma deficiência nutricional. Nos casos mais conhecidos (e dominados) pela medicina, o problema alimentar da criança pode ter raízes orgânicas, como a disfagia (problemas de deglutição) ou mesmo uma deficiência cardíaca. Quando causas fisiológicas são descartadas, é preciso investigar a sério as questões comportamentais.

 

Quando a mãe diz que há um problema, o pediatra tem que encarar que há, de fato, um problema. Crianças com dificuldades alimentares são divididas, normalmente, em quatro grupos: apetite reduzido, alta seletividade, interferência na alimentação pelo choro e sensação de medo durante a alimentação. Em alguns casos, no entanto, a dificuldade alimentar nada mais é do que uma percepção errônea dos pais. Como o caso, por exemplo, de crianças de compleição pequena que comem pouco: com freqüência elas comem pouco justamente por serem pequenas, não o contrário.

 

Estudos mostram que há quatro perfis de pais. O primeiro, chamado responsável, é aquele que consegue entender corretamente a mensagem da criança e responder de acordo. Na seqüência, vêm o indulgente, o negligente e o coercivo. Cada um desses três últimos perfis pode levar a diferentes problemas de nutrição. Quando se é coercivo, por exemplo, reforça-se o medo, e a criança pode parar de comer de uma vez. Para que os pais consigam ser bem orientados, é preciso que os pediatras tenham formação adequada para conseguir identificar as dificuldades da criança, o perfil dos pais e, assim, decidir a melhor abordagem terapêutica.

 

Uma maneira simples de driblar as dificuldades alimentares é os pais darem o exemplo. Em outras palavras, o que os pais comem ou deixam de comer, e sua atitude à mesa, acabam tendo reflexo direto nas escolhas da criança. Aqui, vale o ditado popular: “Tal pai (ou mãe), tal filho”.

 

(*) Médico Pediatra

 

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